Porque um grande poeta nem sempre fala de coisas simples, aqui deixo um poema de Al Berto, um homem cuja obra é uma prova de vida através da arte, uma viagem entre a beleza e o tumulto interior do ser:
A escrita é a minha primeira morada de silêncio
a segunda irrompe do corpo movendo-se por trás das palavras
extensas praias vazias onde o mar nunca chegou
deserto onde os dedos murmuram o último crime
escrever-te continuamente... areia e mais areia
construindo no sangue altíssimas paredes de nada
esta paixão pelos objectos que guardaste
esta pele-memória exalando não sei que desastre
a língua de limos
espalhávamos sementes de cicuta pelo nevoeiro dos sonhos
as manhãs chegavam como um gemido estelar
e eu perseguia teu rasto de esperma à beira-mar
outros corpos de salsugem atravessam o silêncio
desta morada erguida na precária saliva do crepúsculo
Poema publicado no livro "O Medo" publicado pela Assírio e Alvim (1997).
Aproveito para sugerir a quem gosta deste poeta para assistir à peça "A Noite" em cena no Teatro D. Maria II, interpretada por Ana Lúcia Palminha e Pedro Gil do grupo teatral O Bando. A peça baseia-se em poemas de Al Berto com fundos musicais de David Bowie, Einsturzende Neubauten e Velvet Underground.
Pelo que li na revista Time Out desta semana, a peça começa com a voz quebrada de Al Berto exclamando ébrio: "Vocês são mesmo ordinários, foda-se" :)
Carpe Diem.
Etiquetas: Poesia
Foda-se adoro Al Berto... Infelizmente conheço algumas pessoas ordinárias que também "gramam" o gaijo!!!! :(