Indie Lisboa 2009 - Dia 8

Este foi o dia mais longo, para mim, de todas as edições do Indie Lisboa já que assisti a nada mais nada menos que 4 sessões com pouco tempo de intervalo entre elas, contudo, não me arrependo já que a generalidade dos filmes foi superior à média.
Iniciei a maratona deste dia com o filme "Boogie", realizado pelo romeno Radu Muntean, que gira em torno de um casal jovem em férias com um fillho (e à espera de outro) cujo pai (o Boogie do título) atravessa uma crise de meia-idade adiantada ao notar que a sua juventude já passou. Tudo isto acontece quando, na localidade onde a familia decide passar férias, Boogie encontra 2 amigos de juventude que o aliciam a uma noite de borga e desvario.
Na tradição do actual cinema romeno, temos assim um filme com uma toada realista, boas interpretações e uma incidência da história na dificuldade inerente à passagem de uma idade onde a diversão impera e o amanhã ainda fica muito longe e outra onde existem preocupações e partilha de tarefas... a grande questão em Boogie é, sobretudo, o rito de passagem de uma vida a solo para uma onde se tem de contar com terceiros.




Em seguida vi um filme que se encontra em competição no Indie Lisboa, trata-se de "Ballast", realizado pelo americano Lance Hammer. Posso dizer que, dos filmes em competição que tive oportunidade de ver nesta edição do Indie, foi o mais forte de todos... uma autêntica força da natureza e surpreende como uma primeira obra pode ser tão intensa (o filme acabou por ganhar o Prémio principal do Indie).

A intensidade do filme tem origem em duas situações, o facto dos seus actores serem amadores, potenciando assim a autenticidade do quadro social onde estes se inserem e a localização dos seus cenários (naturais) no delta do Mississipi, com toda a carga dramática e luta pela sobrevivência inerente.

O filme começa com uma morte, o suicidio de uma pessoa e a apatia de outra que vivia com a primeira, mais tarde entenderemos que se tratam de 2 irmãos gémeos que vivem lado a lado num mesmo terreno. Ao mesmo tempo acompanhamos James (o miudo da foto do poster acima) que, aos 12 anos, entra numa espiral de drogas e violência sem que a sua mãe, Marlee (uma mulher de classe baixa mas honrada que procura trabalhar para sustentar o filho), dê conta desse facto até que seja tarde demais... para que James escape ao seu destino, Marlee leva-o para a casa do seu ex-marido e pai deste que se havia suicidado.

A partir desse momento todo o filme gira na relação entre as 3 partes, mãe, filho e o tio (Lawrence) gémeo do pai num silêncio feito de pequenos gestos. Será neste silêncio que ficamos maravilhados com o poder desta história, onde descobrimos o passado das personagens, onde se vislumbra um futuro possivel e uma saida para a pobreza. Tratam-se de três pessoas perdidas do Mundo, sem destino, que acabam apoiando-se umas às outras numa nova familia. Um filme intenso e com o "happy end" mais entusiasmante dos ultimos tempos, ainda que fique tudo em aberto... mas, como sou um optimista, acredito que tenha sido um bom final. Será que alguém tem coragem de estrear isto em Portugal??


Tal como acontece com os filmes de Honoré, os de François Ozon também são essenciais para mim e lá fui assistir à sua mais recente bizarria de seu nome "Ricky". Trata-se de um filme sobre Katie (Alexandra Lamy), mãe solteira e empregada numa fábrica, que conhece Paco (Sérgi Lopez) e com ele estabelece uma nova relação. O fruto desta relação, traduzir-se-á num bébé de seu nome Ricky, contudo, este tem uma particularidade muito especial, começam a nascer-lhe asas nas costas...

O filme embarca no que já se convencionou chamar de "realismo mágico", com o uso da metáfora da criança com asas para demonstrar as dificuldades de um casal face a uma criança que vem tornar o relacionamento bem mais sério. Ao mesmo tempo o filme critica a imprensa francesa ao mostrar o seu excessivo interesse por "fait divers" após o vôo (a cena mais louca do filme) de Ricky pelos corredores de um supermercado.

Trata-se de um filme estranho e, em minha opinião, fraco comparativamente aos anteriores de Ozon. A ideia da criança com asas faz rir a espaços, emociona no seu final com a despedida (metáfora para a perda?) mas deixa sempre um travo de estranheza e decepciona para quem como eu se emocionou e divertiu com outros filmes seus ("8 Mulheres", "Swimming Pool", "O Tempo que Resta").


Por fim, neste longo dia, assisti ao filme "Medicine for Melancholy", um pequeno filme indie realizado por Barry Jenkins. A premissa deste filme é a consequência de uma "one night stand" entre um homem e uma mulher afro-americanos, em São Francisco, face ao dia seguinte. O seu inicio é estupendo, com o desconforto entre as partes e a partilha de um táxi numa troca de palavras de circunstância.
Quando ela se esquece da carteira no táxi, dá a ele a oportunidade de prolongar o momento e um motivo para a tornar a ver. Depois de pesquisar a carteira (detectando que ela o tinha enganado quanto ao nome e morada), segue por bicicleta pelas ruas de S. Francisco para lha entregar... com este pretexto o casal passa mais um dia inteiro juntos.
Trata-se de um filme feito com os mesmos moldes da dupla "Antes do Amanhecer"/"Antes do Anoitecer", com um casal à deriva por uma cidade, dialogando sobre a vida com maior incidência na problemática da raça. O casal descobre uma grande empatia entre si, contudo, ela tem namorado e não consegue deixá-lo (ficamos com ideia de que não o deixa pela segurança e conforto que este lhe proporciona e não tanto pelo amor que sente).
Todo o filme foi rodado em cenários naturais, percorrendo as ruas de S. Francisco, num tom aproximado do preto e branco, contudo poderia ser mais caloroso... ao contrário dos 2 filmes referidos, aqui não consegui sentir aproximação pelo casal protagonista.
Impressiona-me, contudo, o facto de uma nova fornada de realizadores americanos conseguirem fazer filmes intensos com poucos meios e baseados em histórias interessantes... os nossos realizadores deviam colocar os olhos neles e aprender qualquer coisa!!
Carpe Diem.

Etiquetas:

 
posted by Carpe Diem ¤ Permalink ¤


0 Comments: